Entrevista: Flávia Linhalis Arantes

Flávia Linhalis Arantes possui Bacharelado Em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Ouro Preto (1998), Mestrado (2000) e Doutorado (2007) em Ciências da Computação e Matemática Computacional pela Universidade de São Paulo (USP São Carlos). É pesquisadora do NIED desde 2010 e atua em pesquisas relacionadas a Educação a Distância, Pensamento Computacional, Interação Humano-Computador e Software Livre.

Como você começou a trabalhar na campo da tecnologia e educação?

Sou formada em Ciência da Computação, tenho mestrado e doutorado na mesma área. Estou em contato com a tecnologia desde que comecei minha graduação, em 1994. Mas apenas em 2007 comecei a atuar em tecnologia e educação, quando participei do Projeto TIDIA-AE (Tecnologia da Informação para o Desenvolvimento da Internet Avançada – Aprendizado Eletrônico). Eu estava terminando meu doutorado quando a Profa. Dra. Maria das Graças Campos Pimentel me ofereceu uma bolsa no Projeto TIDIA-AE, para atuar no laboratório Intermídia da USP de São Carlos. Fui bolsista TT-5 do referido projeto de 2007 até 2009, onde tive a oportunidade de participar de pesquisas e desenvolvimento de ferramentas web para aprendizado eletrônico. Foi por ocasião do TIDIA que conheci o NIED, que também era laboratório de desenvolvimento (LD) do Projeto.

Quais são as suas principais inquietações sobre a área de tecnologia e educação hoje?

Uma das minhas inquietações é perceber que quanto mais se usa a tecnologia menos se sabe a respeito dela. A tecnologia evoluiu muito rapidamente nos últimos anos. Há apenas 30 anos atrás, quando o NIED estava sendo fundado, os primeiros computadores pessoais estavam chegando às escolas. Há 15 anos, quando eu estava terminando a minha graduação, o disquete era a principal mídia para gravação e instalação de programas nos computadores. Hoje em dia os computadores pessoais estão sendo substituídos por laptops e outros dispositivos cada vez menores, cada vez mais velozes e cada vez mais ubíquos. Tablets e smartphones são itens integrantes das mochilas dos adolescentes e até mesmo das crianças. As crianças crescem cercadas de dispositivos diversos e conectadas às redes sociais – são os chamados “nativos digitais”. Mas, apesar da relação mais fluida com o uso da tecnologia, essa geração não sabe (e não está interessada em saber) sobre o funcionamento desses dispositivos, o que gera uma grande massa de “usuários” dependentes da tecnologia sem entender seu funcionamento. Outra inquietação que tenho é sobre a inserção da tecnologia nas escolas. Quando trabalhamos com tecnologia e educação, percebemos a falta de infraestrutura física e humana das escolas para receber a tecnologia e manter os dispositivos funcionais e úteis. É comum o governo ou mesmo iniciativas de projetos de pesquisa trabalharem com as escolas com o intuito de tornar a tecnologia parte do cotidiano e das práticas pedagógicas das mesmas. Mas apesar de tanto esforço, não vemos isso acontecer. O que vemos são máquinas obsoletas e sucateadas porque ninguém faz a manutenção, instituições sem uma conexão decente com a Internet (sem a qual não se faz praticamente nada), professores despreparados para o uso da tecnologia, alunos mais interessados em ver os posts do facebook do que em prestar atenção nas aulas, diretores tentando tornar os recursos tecnológicos de suas escolas funcionais, mas com suas tentativas frustradas por causa da burocracia. Para alguns, a tecnologia na escola é vista como vilã, que atrapalha as aulas ao invés de ajudar. Isso é realmente inquietante.

Descreva um projeto no qual você trabalha, que mais lhe motiva hoje?

Gosto de todos os projetos nos quais atuo. Trabalho no TelEduc, que é um ambiente de e-learning de código livre que está há 17 anos oferecendo uma opção de software para apoio a cursos à distância, presenciais e semipresenciais. Neste ano de 2015 comecei a trabalhar com multimodalidade, em um projeto que propõe um editor multimodal de código livre, com suporte a desenho, escrita, áudio, links e outras mídias. O editor pode ser acessado por dispositivos móveis e agrega várias modalidades de interação (entrada por toque, caneta e mouse). Com esse projeto, esperamos ampliar o alcance e o acesso das pessoas a esse tipo de editor, pois os textos multimodais são cada vez mais comuns no dia a dia da sociedade contemporânea. Por fim, atuo no Projeto Jovem Hacker (www.jovemhacker.org) e posso dizer que, neste ano, foi o projeto que mais me motivou, pois ele está muito relacionado a uma inquietação que falei sobre as pessoas usarem a tecnologia sem a conhecerem. O Jovem Hacker investiga maneiras de auxiliar na formação de uma geração que seja mais autônoma tecnologicamente, para evitar aquela grande massa de usuários dependente da tecnologia sem entender seu funcionamento. Para tanto, o projeto compartilha conhecimento nas áreas de programação de computadores, software livre e trabalho colaborativo para jovens (principalmente) do ensino médio.

Quem você considera suas 5 principais referências (pessoas, artigos, livros, lugares) no que tange tecnologia e educação?

Desde que comecei a trabalhar com tecnologia, procuro deixar todo o software produzido como resultado das minhas pesquisas com licenças livres. Por isso, um grande nome que considero na área de software livre é o Richard Stallman, idealizador da filosofia do software livre, do Projeto GNU e da FSF (Free Software Foundation). Outra referência importante para mim tem sido o Mitchel Resnick e seu grupo de pesquisas do MIT (Massachusetts Institute of Technology), pesquisadores que atuam na área de pensamento computacional.

Qual o projeto de (pesquisa, ensino ou extensão) que você ainda não conseguiu realizar e gostaria de ver sair do chão?

Eu gostaria de trabalhar com a inserção de tecnologias nas escolas. Não é exatamente um projeto que eu gostaria de ver sair do chão, mas algo que acho importante na área de informática na educação com a qual ainda não tive oportunidade de trabalhar e que está bem relacionada com a minha segunda inquietação.